Os vestígios dos castros existentes nos montes da “Quecolha” e do “Gago”, sítios do seu termo, são duas evidências de que o povoamento do território de Angueira antecedeu a dominação romana e esteve na origem da povoação.
Segundo Amadeu Ferreira, o topónimo Angueira remontará aos séculos VI ou VII. Para além de salientar a antiguidade da “capielha de San Miguel”, o saudoso e insigne mirandês assinala a existência de vários documentos escritos – um dos quais do século XII que refere a pertença a Dom Telo Fernandes –, de quatro moinhos de água e a doação de terras de Angueira ao mosteiro de Moreyrola, atualmente da Província de Zamora, em Espanha.
Mais recentemente, de 1864, ano em que contava 396 almas, até à atualidade, Angueira foi sofrendo oscilações da sua população: de sentido crescente até 1950, ano em que contava 668 habitantes; decrescente, a partir de 1960, mas mais acentuada a partir de 1970. Atualmente, a população que, permanentemente, reside em Angueira está reduzida a cerca de 90 habitantes, número que, com a redução natural – seja por internamento em lares, seja por falecimento dos mais idosos – tenderá a agravar-se, diminuindo cada vez mais.
A diminuição da população de Angueira, das localidades do concelho de Vimioso e da generalidade do Nordeste Transmontano é consequência da “diáspora”, que, até meados do século passado, foi, essencialmente, para países da América do Sul, sobretudo para o Brasil, e, nos anos 60 e 70, para França e outros países do centro da Europa. A partir dos anos 70, a saída de jovens para estudar e trabalhar nas cidades e no litoral do Continente e a redução da natalidade, que deixou de compensar a saída de migrantes, agravaram ainda mais os já de si tão graves efeitos daquela debandada. Acompanhando o abandono da agropecuária, estes fenómenos estão na base da atual calamidade demográfica que, também lá, se verifica.
Já no século XXI, se a redução da população residente atingiu níveis que ameaçam e comprometem mesmo a própria sobrevivência de Angueira e das mais localidades do concelho, mais preocupante é ainda a idade avançada da generalidade dos atuais residentes. É que lhe faltam, hoje, crianças e jovens que as possam revitalizar e garantir, assim, a sua continuidade.
São vários os problemas com que Angueira, uma povoação milenar a que me prendem os laços familiares, atualmente, se defronta. É uma dor de alma ter assistido ao encerramento da escola, ver dezenas de casas desabitadas, terras – e, até, hortas – sem cultivo, lameiros invadidos por mato, açudes, “calendras”, moinhos e casas do moleiro em ruína e ao abandono. Mas, o que ainda mais dói é ver tantos familiares, amigos e conhecidos que foram e vão partindo para sempre.
Para além de traduzirem o despovoamento e a consequente paralisação da atividade económica, este conjunto de sinais ilustra também o desacerto das políticas nacional e local: o abandono a que, fazendo jus ao velho aforismo – “Lisboa é a capital e o resto é província!” –, as localidades do Interior têm sido deixadas pelo Poder Central; a indiferença, o deixa andar ou ficar à espera que, por milagre, os problemas se resolvam ilustram a inércia revelada pelo Poder Local.
Apesar de tudo, constata-se que, nunca como atualmente, Angueira e o concelho de Vimioso dispuseram de condições tão confortáveis para albergar os residentes e acolher os naturais, que se viram forçados a deixá-la, e os seus descendentes, bem ainda os amigos e visitantes. Foram e continuam a ser recuperadas algumas casas de habitação, boa parte das quais recorrendo à utilização de materiais tradicionais. Um bom prenúncio, sem dúvida. Mas, sendo ainda pouco, é preciso e importa fazer muito mais.
Se ficarmos indiferentes, impassíveis ou à espera, Angueira e as mais localidades do concelho de Vimioso correm o risco de perder a sua identidade e, pior que isso, de definharem irremediavelmente. Porém, está nas nossas mãos ajudar a evitar tão grave ameaça. Revitalizá-las é, pois, o grande desafio que, atualmente, se coloca aos naturais, residentes ou não, e aos seus descendentes, espalhados por Portugal e pelo Mundo, bem ainda aos seus amigos. Estou crente de que, irmanados neste ideal, dando as mãos, unindo esforços e aproveitando o que de bom também nos trouxe a chamada aldeia global, cada um e o conjunto dos aderentes ao grupo Angueira Atalaia, integrante do grupo maior, a Comunidade em Rede Atalaia, podemos e vamos dar o melhor de nós, um inestimável contributo para afastar tal ameaça.
Da confluência de esforços, do estreitamento de laços e do diálogo entre os membros do grupo de cada uma e das 22 localidades que integram a Comunidade em Rede Atalaia, potenciando sinergias, para além de servir de ponte, num longo abraço e na recriação ou no estreitamento de laços entre os naturais e os descendente de outros naturais, que, em resultado da “diáspora”, há mais ou menos tempo, se encontram espalhados pelo mundo, há de resultar também – pelo menos, assim espero – a (re)animação, a revitalização e o engrandecimento das localidades e do concelho de Vimioso. Convictos de que juntos somos mais fortes, contribuiremos, assim, para as dar a conhecer e tornar melhores e mais apetecíveis localidades para trabalhar, visitar e (con)viver.
Angueira e o concelho de Vimioso precisam e merecem. Vamos a isso?!
Um abraço a todos.
Notas:
1) A casa da primeira foto, que era do “tiu Joan Fresco” ou “Ratico” e da “tie Justina Rata”, foi recuperada pelo professor Vítor Brancal, do Porto, que, após a aposentação, fixou residência permanente em Angueira.
2) A casa da segunda foto, que, para além da casa de viver, tinha também a “frauga” do “tiu Ferreiro”, foi recuperada pelo major Emílio Torrão.
3) A casa da terceira foto, que era a casa dos pais da dona Infância Cachona, casada com o sargento Aníbal Toucinho, foi recuperada pelo filho, engenheiro Aníbal e sua esposa, a arquiteta Vera, que, atualmente, estão a recuperar também a casa que era dos “Nabarros”.
4) A casa da quarta foto, que era do capitão Bernardino e da dona Maria Rosa “Steba”, foi recentemente recuperada pelo filho, o dr. Paulo Bernardino.
5) A casa da quinta foto, que era do “tiu Chetas” e da “tie Belisanda Bitorina”, foi recuperada pelo engenheiro Vítor Moreira, de Braga, que, desde a sua juventude, habitualmente, caça e permanece largos períodos de tempo em Angueira.
6) Felizmente, há ainda mais casas já recuperadas e outras em recuperação. Porém, de momento, não disponho de fotos das mesmas que me permitam mostrá-las aqui.
Se quiser visualizar algumas fotos aéreas de Angueira, sugiro-lhe a consulta do blogue:
http://portugalfotografiaaerea.blogspot.pt/2017/01/angueira.html
Caso queira saber a localização de algum dos muitos sítios do termo de Angueira, carregue no “link”:
www.openstreetmap.org/searchquery=Angueira%2C%20vimioso%2C%20portugal#map=12/